Brasil pode revolucionar produção de biocombustíveis de forma inusitada

Uma bactéria isolada por pesquisadores brasileiros pode ser a solução para aumentar a produção de biocombustíveis a partir de resíduos agrícolas. Candidatus Telluricellulosum braziliensis é o nome proposto para a descoberta descrita em um artigo na revista Nature.

A bactéria foi identificada após análises de solo em lavouras de cana-de-açúcar de uma biorrefinaria de Quatá, no interior de São Paulo. Os cientistas descobriram que o microrganismo gera uma enzima que usa cobre para quebra da celulose em resíduos, gerando matéria-prima para combustíveis, têxteis e outros produtos.

Ao Jornal da USP, o autor principal do artigo, Mario Murakami, do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), explicou que o segredo está na “matéria escura” do DNA — material genético que não pode ser cultivado em laboratório.

Análise de solo foi feita em refinaria de cana no interior de São Paulo (Imagem: Bidstrup/iStock)

“É como um mundo oculto de informação genética que estamos apenas começando a explorar. Essa ‘matéria escura’ pode ser a chave para descobrir novas enzimas e processos biológicos”, afirmou.

A metaloenzima é chamada de CelOCE (Enzima de Clivagem Oxidativa da Celulose) e facilita um processo em que a celulose geralmente é degradada a partir de “cortes” do seu constituinte básico, a glicose.

“Ao contrário de outras enzimas, a CelOCE funciona ligando-se ao final da cadeia de celulose e ‘cortando’ uma única unidade, produzindo ácido celobiônico. Ela sozinha é incapaz de liberar glicose, mas atua abrindo ‘fechaduras’ moleculares para a ação de outras enzimas conhecidas”, explicou Murakami.

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Processo também pode ser aproveitado pela indústria de papel e têxtil (Imagem: DedMityay/iStock)

Aplicação prática

Os pesquisadores sugerem que a CelOCE seja combinada com coquetéis enzimáticos para “aumentar a quantidade de açúcar obtido da celulose, tornando o processo mais eficiente e econômico”, aprimorando o processo de produção de biocombustíveis e outros bioprodutos.

“Este processo é vital para vários setores industriais, incluindo a produção de biocombustíveis, papel e têxteis. Podemos transformar resíduos vegetais em produtos valiosos ao quebrar a celulose”, enfatiza Murakami. “Esta descoberta muda o paradigma da degradação da celulose pela vida microbiana, adicionando uma nova classe de enzimas estrutural e funcionalmente distintas.

A pesquisa faz parte de um programa do CNPEM para mapeamento do patrimônio genético da biodiversidade brasileira com fins biotecnológicos para aplicação pela indústria, agricultura, além de setores de saúde humana e nutrição animal.

Também participaram do estudo pesquisadores da USP, Universidade de Aix Marseille, CNRS (França) e Universidade Técnica da Dinamarca.

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