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Desigualdade é uma lei natural? A arqueologia revela

Você já deve ter ouvido que contraste social é algo impossível de evitar, quase uma “lei da natureza”. Mas e se disséssemos que povos antigos viveram por milênios sem super-ricos nem explorados? Um estudo analisou 50 mil casas de civilizações antigas ao redor do mundo e chegou a uma conclusão surpreendente: a desigualdade não acompanha a humanidade como uma sombra. Ela surge (ou não) de acordo com as regras que escolhemos seguir.

Em vez de pirâmides com faraós e camponeses, alguns povos construíram cidades onde ninguém acumulava demais. A diferença entre casas era mínima. Ninguém vivia em palácios enquanto outros passavam fome. E o mais curioso: isso não dependia do tamanho da população ou da complexidade do governo.

A chave estava nas decisões coletivas. Regras claras impediam o acúmulo exagerado. Leis, impostos e até festas públicas financiadas pelos mais ricos ajudavam a manter o equilíbrio. Em algumas culturas, heranças eram limitadas. Em outras, dívidas eram perdoadas após a morte. A desigualdade, ao que tudo indica, seria uma invenção — não um destino.

Desigualdade tem história — e exceções

O desequilíbrio não foi sempre a norma. De acordo com a revista Live Science, um estudo recente revela que várias sociedades viveram por séculos com baixos níveis de disparidade social. Os arqueólogos envolvidos na pesquisa usaram o tamanho das moradias como um indicador de riqueza e descobriram que nem o crescimento populacional nem a complexidade dos governos são fatores determinantes para o surgimento de elites dominantes.

Pesquisadores comandam as escavações na residência da Plataforma 11 em El Palmillo, México (Imagem: Linda Nicholas e Gary Feinman/Divulgação)

Cidades como Mohenjo-Daro, no Vale do Indo, e os assentamentos tripilianos, na atual Ucrânia, cresceram com planejamento urbano sem sinais de concentração de riqueza. Em contraste, outras regiões só registraram desigualdade expressiva muitos séculos após o início da agricultura.

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A pesquisa também destaca o papel da cultura e da ideologia. Em sociedades onde a cooperação era valorizada mais do que a competição, o acúmulo excessivo de riqueza era malvisto — ou até impedido por normas sociais. Já em contextos onde o prestígio vinha da ostentação, as diferenças tendiam a se ampliar.

O que as ruínas nos ensinam sobre o presente

Os dados levantados pelo estudo cobrem um intervalo de tempo que vai do fim do Pleistoceno até o início do colonialismo europeu — cerca de 10 mil anos de história. Com essa escala, os arqueólogos conseguiram mostrar que a desigualdade não é um produto inevitável da civilização, mas algo que varia de acordo com as decisões humanas ao longo do tempo.

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Sociedades complexas podem prosperar sem a necessidade de elites dominantes, segundo estudo (Imagem: rustamank/Shutterstock)

Essa perspectiva histórica ajuda a colocar em xeque discursos modernos que tratam disparidades sociais como naturais ou imutáveis. Se povos antigos conseguiram desenvolver cidades organizadas, com redes de troca, cultura complexa e pouca desigualdade, o que impede sociedades atuais de buscar modelos mais justos? A pesquisa oferece um contraponto poderoso ao conformismo econômico.

Para Gary Feinman, autor principal do estudo, a arqueologia pode servir como um espelho — mostrando que há alternativas viáveis ao modelo atual. Ao estudar o passado com método e dados comparáveis, é possível entender que o futuro também está aberto a escolhas. Afinal, se a desigualdade foi evitada antes, ela pode ser enfrentada de novo.

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Figura de ouro Tumaco-Tolita revela segredos de uma civilização perdida

Uma estatueta de ouro com mais de 2.000 anos, descoberta na região onde a moderna fronteira entre Colômbia e Equador se encontra, revela detalhes impressionantes de uma cultura que prosperou na costa norte do Pacífico sul-americano. A figura de ouro Tumaco-Tolita é uma das mais raras e preciosas evidências dessa civilização que desapareceu há cerca de 1.500 anos, mas que deixou legados de extraordinária arte em metal.

A peça, que representa uma pessoa com um “adereço nasal elegante”, faz parte do vasto conjunto de obras criadas pelo povo Tumaco-Tolita, uma cultura sem registros escritos, mas com uma grande habilidade em metalurgia.

Estátua de ouro da civilização antiga possui adereço nasal (Imagem: Museu Metropolitano de Arte, Nova York)

Datada de cerca de 1 a 300 d.C., a estatueta possui um significado profundo para os estudiosos, uma vez que nos ajuda a entender melhor os rituais e a organização social de um povo que desapareceu antes da chegada dos europeus. O artefato está atualmente exposto no Museu Metropolitano de Arte, em Nova York.

O povo Tumaco-Tolita e suas habilidades metálicas

  • O povo Tumaco-Tolita, nome dado à cultura tanto na Colômbia quanto no Equador, prosperou em uma região rica em depósitos naturais de ouro e platina, localizada no delta do Rio Cayapas, na fronteira entre os dois países.
  • Acredita-se que entre 200 a.C. e 400 d.C., essa sociedade tenha desenvolvido uma das mais refinadas tradições de metalurgia das Américas, sendo habilidosos na criação de figuras humanas e animais, bem como de joias delicadas.
  • Eles também estabeleceram grandes praças cercadas por aldeias e montes de terra usados tanto para habitação quanto para enterramentos de elites.
  • Com cerca de 22,9 centímetros de altura, a estatueta de ouro encontrada possui algumas características que sugerem que representava uma figura feminina, devido aos detalhes como os seios esculpidos.
  • Contudo, a falta de saia torna o gênero da figura ambíguo, pois, embora as saias fossem comuns em imagens femininas, elas não eram imprescindíveis.
  • Além disso, a cabeça achatada da figura é um reflexo de uma prática cultural conhecida como modificação do crânio, onde a cabeça dos bebês era amarrada para crescer com uma forma específica, indicando alta posição social.

Significado ritual e função das estátuas

A função exata dessas estatuetas ainda é um mistério. Pesquisadores do Museu Metropolitano, como o especialista Hugo Ikehara-Tsukayama, sugerem que as figuras de ouro eram provavelmente usadas em rituais religiosos, especialmente devido à presença do adereço nasal, que pode ter sido parte de um traje cerimonial.

A ausência dos pés na estatueta indica que ela foi provavelmente feita para ser exibida de alguma forma, possivelmente em cerimônias em que o figurino completo incluía acessórios e objetos nas mãos da estátua.

Estátua de ouro Tumaco-Tolita não possui pés (Imagem: Museu Metropolitano de Arte, Nova York)

Mesmo após o desaparecimento dos Tumaco-Tolita, muitos desses artefatos sobreviveram como heranças culturais até o século XVI, quando os conquistadores espanhóis os encontraram e escreveram sobre as figuras de argila e ouro e as joias finamente trabalhadas que os indígenas possuíam. Esse vínculo com o passado revela a longevidade do legado artístico e cultural da região, embora as causas do desaparecimento dos Tumaco-Tolita permaneçam desconhecidas.

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A desaparição da civilização Tumaco-Tolita

Por volta de 500 d.C., as áreas ao redor da ilha fluvial de La Tolita foram gradualmente abandonadas, e os Tumaco-Tolita aparentemente se dispersaram, deixando para trás apenas vestígios de sua existência e uma vasta herança cultural.

O declínio dessa civilização é ainda um tema de debate, com algumas teorias sugerindo mudanças climáticas ou movimentos de outras culturas como possíveis causas.

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O eclipse lunar na visão das antigas civilizações

Estamos nos aproximando do evento astronômico mais aguardado do ano: no próximo dia 14 de março, a Lua mergulhará na sombra da Terra, dando origem a um fascinante espetáculo celeste – um Eclipse Lunar Total. Para nós, uma exibição astronômica de encher os olhos e extasiar a alma. Mas, e se estivéssemos em outra época, sob o céu de uma civilização antiga? Para nossos ancestrais, esse mesmo evento poderia ser um presságio sombrio, um sinal de ira divina ou até mesmo uma batalha cósmica. Então, que tal embarcar em uma viagem no tempo para descobrir como diferentes culturas enxergavam esse enigmático “apagão” da Lua?

A humanidade iniciou sua jornada sobre este planeta sem nenhum tipo de conhecimento prévio, sem nenhum manual e nenhum “irmão mais velho” que pudesse orientar nossos primeiros passos e explicar os mistérios da Terra e do céu. Todo conhecimento que acumulamos ao longo de milhares de anos, partiu do nada e foi construído pouco a pouco, baseado em nossas observações e naquilo que conseguíamos transmitir de geração em geração. Sem o conhecimento astronômico que temos hoje, fenômenos celestes eram geralmente vistos como manifestações divinas, sinais diretos dos deuses.

Assim como o Sol e a Lua, em várias culturas, eram vistos como divindades, os eclipses lunares eram frequentemente entendidos como uma mudança de humor destes deuses. E todo mundo sabe que um deus irritado pode não ser muito agradável! Por isso, nossos antepassados temiam os eclipses, imaginando que poderiam ser o prenúncio de alguma catástrofe iminente. Para uns, o fim do mundo estava próximo. Para outros, era preciso agir rápido para salvar a Lua dos monstros que a devoravam.

Eclipse lunar total de 31 de janeiro de 2018, registrado em Chiricahua Mountains, Arizona. Crédito: Fred Espenak (MrEclipse.com)

Na antiga Mesopotâmia, os eclipses lunares eram considerados maus presságios, especialmente para o rei. Os astrônomos babilônicos, que já possuíam grande conhecimento sobre os ciclos celestes, registravam cuidadosamente os eclipses e os interpretavam como sinais de um perigo iminente. Para proteger o rei das possíveis tragédias anunciadas pelo eclipse, um ritual curioso era realizado: o ritual do rei substituto. 

Neste ritual, o rei abdicava de seu trono e se escondia por um período de até 100 dias. Durante esse tempo, um rei substituto era escolhido, geralmente um prisioneiro, um adversário político, ou algum súdito muito devoto. Embora não tivesse muito poder, o rei substituto desfrutava das mordomias da côrte, das riquezas e do prestígio real. Enquanto isso, o rei afastado era submetido a exorcismos para se livrar de toda a má sorte, ou melhor, transferir a má sorte para aquele que estava em seu lugar. Então, quando enfim acreditava que estava fora de perigo, o verdadeiro rei retomava o trono e o substituto, bem… era sacrificado. 

É… os antigos babilônios eram mesmo criativos e, talvez, um pouco drásticos, não acham?

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Na China, a explicação para os eclipses lunares era igualmente criativa. Acreditava-se que um dragão celestial devorava a Lua durante o eclipse, fazendo-a desaparecer pouco a pouco no céu noturno. Eles também acreditavam que aquilo seria sinal de má sorte para o império e, principalmente, para o imperador. Então, para espantar o monstro e trazer a Lua de volta, as pessoas batiam tambores, faziam barulho e lançavam flechas em direção ao céu – uma demonstração de coragem e união contra a ameaça cósmica. Um ritual bem mais saudável que o dos babilônios… desde que ninguém fosse atingido por uma flecha perdida!

Arqueiro chinês atirando flechas no dragão que estaria causando um eclipse – Autor desconhecido, fonte: “The New Year Painting of Zhang Xian”

Os maias, que habitaram a América Central, eram conhecidos por seus avançados conhecimentos astronômicos, mas também temiam os eclipses lunares. Para eles, um jaguar celestial atacava ferozmente a Lua, ferindo-a e tingindo-a de sangue. Mulheres grávidas eram protegidas durante o eclipse, pois acreditava-se que o evento poderia causar malformações nos bebês. Apesar do medo, os maias desenvolveram um calendário lunar tão preciso que lhes permitia prever a ocorrência de eclipses – e, para alguns, até mesmo o fim do mundo!

Já os incas não tinham a capacidade de prever eclipses, mas também acreditavam que a Lua estava sendo atacada por um jaguar cósmico. A Lua, chamada de Mama Quilla, era uma deusa protetora, venerada pelas mulheres, e esposa do Sol. E para salvar a Mama Quilla daquele ataque voraz, os incas recorriam a uma técnica, um tanto rudimentar: eles atiçavam os cachorros, batiam tambores e faziam uma imensa algazarra pelas ruas, na tentativa de espantar o felino cósmico, antes que ele resolvesse descer até a Terra para comer todo mundo.

Povo inca tentando espantar o “jaguar que devora a Lua” durante um eclipse lunar. Créditos: Leonard de Selva

Os vikings, povo nórdico famoso por suas lendas e mitos, acreditavam que os eclipses lunares eram causados pelos lobos Sköll e Hati, que perseguiam o Sol e a Lua pelo céu. Quando um deles finalmente alcançava sua presa, a Lua desaparecia no céu. Assim como os chineses e os incas, os bravos vikings se esforçavam para espantar o algoz lunar com gritaria, estrondos e o soar de suas armas, numa tentativa de salvar o astro do ataque.

Com o tempo, a observação cuidadosa do céu e o desenvolvimento do pensamento científico levaram a uma compreensão mais precisa dos eclipses. Os gregos começaram a entender a natureza do fenômeno, percebendo que a Terra se interpunha entre o Sol e a Lua, projetando sua sombra sobre a Lua e causando o eclipse. Com base nessa compreensão, Aristarco de Samos calculou o tamanho e a distância da Lua a partir da observação dos eclipses lunares, demonstrando como a astronomia podia revelar os segredos do cosmos.

Hoje, com os avanços da astronomia, sabemos que os eclipses lunares são eventos perfeitamente previsíveis, calculados com precisão de segundos. Graças à ciência, não precisamos mais temer a ira dos deuses e podemos simplesmente admirar o esplendor de um eclipse, sem imaginar que a Lua está sendo devorada por lobos, dragões ou jaguares. Mas, mesmo com todo o nosso conhecimento científico, os eclipses lunares ainda nos fascinam, nos conectando com a beleza e o mistério do universo.

Na madrugada de 14 de março de 2025, teremos a oportunidade de apreciar um eclipse Total da Lua. Um evento raro e espetacular, que nos convida a olhar para o céu com o mesmo fascínio dos nossos ancestrais, e festejar, não para espantar o jaguar, mas para celebrar o conhecimento astronômico acumulado por inúmeras gerações. Então, não percam essa oportunidade! Porque o próximo eclipse total da Lua visível do Brasil só acontecerá em 2029.

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