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Pontos de Lagrange: ilhas gravitacionais no oceano cósmico

Imagine uma espaçonave utilizando a gravidade dos astros para navegar pelo vasto oceano cósmico, até encontrar uma ilha invisível e serena, onde as forças que movem nossas aventuras pelo espaço estão em perfeito equilíbrio. Essa é a essência dos chamados Pontos de Lagrange — regiões específicas do espaço onde as forças gravitacionais se anulam com precisão matemática, criando verdadeiros refúgios de estabilidade em meio ao movimento celestial. Mais do que uma curiosidade astronômica, os Pontos de Lagrange representam uma solução elegante para um clássico problema da Física e um grande trunfo para as ambições espaciais da humanidade.

Para entendermos essa história, precisamos voltar ao século XVII, quando Isaac Newton revelou ao mundo sua famosa Lei da Gravitação Universal. Ela dizia que todos os corpos do Universo se atraem mutuamente, com uma força que depende da massa de cada um e da distância entre eles. Essa formulação nos permitiu calcular os passos da dança cósmica entre dois corpos, descrevendo órbitas perfeitamente elípticas e previsíveis. A gravitação de Newton nos levou à compreensão dos movimentos da Terra ao redor do Sol, da Lua em torno da Terra e à previsão precisa dos caminhos dos planetas do Sistema Solar.

Mas, ao mesmo tempo em que revelou os segredos da mecânica celeste, o trabalho brilhante de Newton também expôs um problema intrigante: o que acontece quando três corpos interagem gravitacionalmente ao mesmo tempo? O chamado “problema dos três corpos” tornou-se um verdadeiro quebra-cabeça para os cientistas. Enquanto o movimento entre dois corpos podia ser descrito por fórmulas relativamente simples, a introdução de um terceiro corpo criava um sistema dinâmico altamente complexo e caótico. Até hoje, esse problema não possui uma solução exata em sua forma geral — variações mínimas nas condições iniciais podem alterar drasticamente os caminhos seguidos pelos corpos envolvidos.

[ Trajetórias aproximadas de três corpos idênticos localizados nos vértices de um triângulo escaleno e com velocidades iniciais nulas. Imagem: wikimedia.org ]

E é aí que entra o gênio de Joseph-Louis Lagrange.

Em 1772, esse brilhante matemático franco-italiano publicou um “Ensaio sobre o problema dos três corpos”, no qual demonstrou duas soluções especiais para o problema: a colinear e a equilátera. Lagrange identificou cinco regiões específicas no espaço onde um objeto de massa muito pequena — como um satélite — poderia permanecer em equilíbrio gravitacional com dois corpos muito maiores, como o Sol e a Terra.

Esses pontos foram batizados em sua homenagem como Pontos de Lagrange, ou simplesmente L1 a L5. Mas, fazendo justiça histórica, Lagrange não foi o primeiro a descrever todos os cinco. A solução colinear — que abrange os pontos L1, L2 e L3 — havia sido descoberta anteriormente por seu mentor, o físico e matemático suíço Leonhard Euler, por volta de 1750.Mas para entendermos por que essas regiões funcionam como verdadeiras ilhas de estabilidade, é preciso lembrar que, em um sistema orbital com dois corpos, não é exatamente o corpo menor que gira ao redor do maior. Na verdade, ambos orbitam um centro de massa comum. No caso do sistema Terra-Sol, como a massa da Terra é muito menor, esse centro de massa está muito próximo do Sol — mas não exatamente no seu centro.

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Pontos de Lagrange e a Terceira Lei de Kepler

Outro conceito essencial é a Terceira Lei de Kepler, que diz que o quadrado do período orbital de um planeta é proporcional ao cubo da sua distância ao Sol. Na prática, isso significa que quanto mais afastado do Sol, mais tempo o corpo leva para completar uma volta. Mais tarde, as equações de Newton mostraram que esse período também depende da massa do corpo maior, sendo um período menor para uma massa central maior e vice-versa. 

Com esses dois conceitos em mente — o centro de massa do sistema e a relação entre período e distância orbital — começamos a entender como surgem os Pontos de Lagrange.

Considerando o sistema Terra-Sol, o Ponto L1 está localizado entre os dois, a cerca de 1,5 milhão de quilômetros da Terra. Um terceiro corpo nessa posição, por estar mais próximo do Sol do que a Terra, deveria orbitá-lo em um período menor, segundo a Terceira Lei de Kepler. Mas nesse ponto, a atração gravitacional do nosso planeta anula parte da gravidade solar, aumentando o período orbital para coincidir exatamente com o da Terra: um ano. Isso permite que o Observatório Solar SOHO, por exemplo, permaneça ali como se estivesse parado, equilibrando-se entre a Terra e o Sol.

[ Pontos de Lagrange no Sistema Terra Sol – Imagem: wikimedia.org ]

Já o Ponto L2 está também a 1,5 milhão de quilômetros da Terra — só que na direção oposta, além da órbita terrestre. Por estar mais distante do Sol, o período orbital ali deveria ser maior. No entanto, nesse ponto, as forças gravitacionais do Sol e da Terra se somam, reduzindo o período, de um objeto neste ponto, para os mesmos 365 dias e 6 horas do nosso planeta. É justamente em L2 que o Telescópio Espacial James Webb se protege do calor e da luminosidade do Sol, da Terra e da Lua — garantindo o ambiente ideal para registrar as imagens mais espetaculares do Universo.

Da mesma forma que em L2, a soma das gravidades da Terra e do Sol também é responsável pelo Ponto L3, que fica um pouco além da órbita da Terra, mas na direção oposta ao Sol. Embora L3 não seja utilizado atualmente, ele já inspirou propostas de missões e até histórias de ficção científica.

Já os Pontos L4 e L5 — que compõem a solução original proposta por Lagrange — formam triângulos equiláteros com a Terra e o Sol. L4 fica 60° à frente da Terra em sua órbita, e L5, 60° atrás. Ambos estão ligeiramente além da órbita da Terra, mas orbitam o centro de massa do sistema Terra-Sol, na distância certa para que seus períodos orbitais sejam sincronizados com o da Terra.

Os três pontos colineares — L1, L2 e L3 — possuem um equilíbrio instável. Isso significa que objetos posicionados ali tendem a se afastar com o tempo, exigindo manobras periódicas de correção, como as que mantêm o SOHO e o James Webb em suas posições.

Por outro lado, L4 e L5 são regiões de equilíbrio estável. Mesmo quando perturbados por pequenas forças externas, os objetos ali tendem a permanecer próximos desses pontos. É por isso que encontramos objetos naturais em L4 e L5, como os famosos asteroides troianos de Júpiter — que serão visitados pela missão Lucy, a partir de 2027.

[ Asteroides troianos de Júpiter em L4 (60° à frente) e L5 (60° atrás) do gigante gasoso – Créditos: Petr Scheirich / Astronomical Institute of the Czech Academy of Sciences ]

Assim, entre o rigor das equações e a beleza do cosmos, os Pontos de Lagrange nos lembram que até mesmo no aparente caos do universo existe harmonia — refúgios secretos onde forças colossais se equilibram com delicadeza. Seus mistérios foram desvendados matematicamente por Euler e Lagrange, bem antes de nossos telescópios enxergarem os asteroides e de nossos foguetes abrirem os caminhos para a conquista do espaço. Os pontos de Lagrange são como ilhas gravitacionais no oceano cósmico, que acolhem os instrumentos que nos ajudam a compreender o espaço, o tempo e nosso próprio lugar na imensa vastidão do Universo. Em cada ilha de equilíbrio, há um convite à curiosidade, um desafio à engenharia e um novo porto seguro — onde podemos ancorar as espaçonaves da nossa jornada astronômica rumo às estrelas.

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O que preciso saber antes de comprar um telescópio?

Todas as sextas-feiras, ao vivo, a partir das 21h (pelo horário de Brasília), vai ao ar o Programa Olhar Espacial, no canal do Olhar Digital no YouTube. O episódio da última sexta-feira (11) (que você confere aqui) tratou sobre a história dos telescópios, como eles são produzidos e qual os detalhes que os amantes da astronomia têm que ficar de olho na hora de escolher o melhor instrumento de observação.

A última edição do programa contou com a presença do produtor de telescópios Sandro Coletti. Em entrevista ao apresentador Marcelo Zurita, o artesão contou como essas ferramentas astronômicas surgiram e qual a importância de Galileu e Newton em sua evolução. Além disso, explicou como é sua oficina de produção e quais detalhes fazem um bom telescópio.

“Há mais de quatro séculos, a invenção do telescópio revolucionou a nossa visão do universo, abrindo uma janela para o cosmos e revelando os seus segredos mais profundos”, comentou Zurita.

Marcelo Zurita e Sandro Coletti no Olhar Espacial. (Imagem: Olhar Digital)

Telescópios: um acidente revolucionou a ciência

A origem dos telescópios foi acidental, segundo explicou Coletti. No começo do século XVII, o ótico holandês Hans Lippershey observava seu filho brincando com algumas peças de vidro. De repente, o garoto alinhou uma lente de distância focal comprida com outra mais curta, que colocou perto do olho. Assim, ele percebeu que poderia ampliar objetos distantes.

Logo, Lippershey começou a produzir e vender um objeto que juntava as duas lentes. Inicialmente, os compradores o usavam para observações terrestres, colaborando para o avistamento de pedaços de terra em meio ao oceano, durante as navegações.

Tudo mudou quando o astrônomo Galileu Galilei soube dessa nova invenção. O cientista logo fez questão de criar sua própria versão, o “galileoscópio”, e mirou o instrumento para o céu noturno. Suas descobertas foram tão grandes que houve conflito entre os novos conhecimentos e os pensadores da época, levando Galilei a se retratar.

Pintura em que Galileu Galilei mostra seu telescópio para figuras do clero
Galileu sofreu resistência às suas ideias. (Imagem: Henry-Julien Detouche)

Mesmo com tamanho progresso, o astrônomo ainda usava uma lente de baixa qualidade. Segundo Coletti, o pouco refinamento da produção limitava a observação espacial a objetos muito brilhantes, fazendo com que alguns astros fossem difíceis de se estudar.

Anos depois, o matemático Johannes Kepler trouxe modificações para a ferramenta. Ele trocou a lente ocular de Galilei por uma biconvexa convergente, o que aumentou o campo de observação, mas deixou a imagem de ponta cabeça.

“Os instrumentos melhoraram de forma muito lenta nessas primeiras décadas do telescópio como instrumento cientifico”, comentou Coletti.

Foi no século XVIII que pesquisadores começaram a testar novas combinações de lentes. Porém, uma falha atrapalhava suas observações: a aberração cromática. Ela acontece quando a luz atravessa a lente de vidro e as ondas se dispersam de tal forma que as bordas da imagem ficam com uma “sombra” colorida, geralmente vermelha e roxa.

Newton mudou tudo

O físico Isaac Newton trocou as lentes por espelhos em seus testes, o que abriu um novo caminho para a construção de telescópios. Essa alteração resolveu a aberração cromática porque a luz não atravessa o espelho e assim não se decompõe.

Ele conseguiu chegar em imagens nítidas principalmente por poder calcular a medida das peças e ser especialista em óptica. O aprimoramento foi tão grande que reflete na técnica de produção de telescópios até hoje.

“Não consigo conceber uma solução mais extraordinária que o telescópio de Newton”, constatou o entrevistado.

Um telescópio de madeira com uma esfera em baixo. Uma réplica do projeto original de Newton
Réplica em madeira do Telescópio de Newton. (Imagem: Andrew Dunn / Wikimedia Commons)

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Como reconhecer um telescópio de qualidade?

Coletti comenta que, para além das lentes, a parte mecânica é fundamental.”95% de um telescópio é mecânico”, disse ele.

Em sua oficina, a maioria das ferramentas é voltada para o desenvolvimento de uma boa estrutura de metal para o instrumento. “Não basta ter apenas um espelho de qualidade, você tem que ter uma mecânica muito forte, estável e precisa”, explicou o produtor.

O entrevistado e Zurita observaram algumas falhas que telescópios à venda têm apresentado. Segundo eles, é importante ficar atento ao espelho secundário, que é plano e reflete a imagem do espelho curvado maior, que fica voltado para o céu.

Coletti mostrou alguns testes que fez com uma luz monocromática sobre os espelhos. Assim, ele conseguiu demonstrar as falhas da peça com uma técnica inventada por Newton. “Deve ser a segunda pior superfície óptica de ser feita. Plano não tem tolerância, ou ele é plano, ou não é”, disse o produtor.

Outro problema dos telescópios de produção industrial é a falta de estabilidade. Segundo Coletti, não é normal o instrumento tremer muito, o que prejudica a observação e pode acabar afastando as pessoas da prática.

Vale a pena fazer telescópios?

Coletti comentou que fica horas se dedicando a produção de peças e agora está produzindo um focalizador novo. Para a comunidade de produtores e interessados, ele posta vídeos ensinando a resolver problemas recorrentes na fabricação e dá dicas.

“Você aprende tanta coisa fabricando telescópios: mecânica, óptica, materiais… Tudo é muito legal”, disse o entrevistado.

Sandro Coletti divulga seu trabalho pelo Instagram: @sandrocoletti. Por lá também é possível entrar em contato com o produtor e adquirir seus telescópios.

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Pesquisadores ampliam método de Newton, criado há mais de 300 anos

Pesquisadores expandiram o clássico método de Newton, desenvolvido pelo cientista Isaac Newton há mais de 300 anos, para tornar a técnica mais poderosa e eficiente na resolução de funções complexas.

Originalmente, o método de Newton utilizava a primeira e segunda derivada para aproximar soluções de funções difíceis, mas tinha limitações ao lidar com funções de múltiplas variáveis.

Uma equipe liderada por Amir Ali Ahmadi, da Universidade de Princeton, desenvolveu um novo algoritmo que resolve esses desafios, permitindo trabalhar com múltiplas variáveis e derivadas sem perder eficiência. O estudo sobre o algoritmo foi publicado no servidor arXiv.

Princípios do novo método

  • A inovação se baseia na modificação da expansão de Taylor, garantindo que as equações resultantes sejam “convexas” e possam ser expressas como uma soma de quadrados.
  • Isso facilita a minimização da função, um passo crucial para encontrar o valor mínimo desejado.
  • Com essa modificação, o novo algoritmo mantém a capacidade de convergir para o mínimo verdadeiro de uma função de maneira mais rápida, requerendo menos iterações do que as técnicas anteriores.
Método criado por Isaac Newton há séculos ainda possuía limitações – Imagem: Janusz Pienkowski/Shuttertock

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Embora cada iteração do novo algoritmo seja mais cara computacionalmente, ele promete ser significativamente mais rápido à medida que a tecnologia de computação evolui.

Essa abordagem oferece um grande potencial para aplicações em otimização e aprendizado de máquina, podendo, no futuro, substituir o método de Newton em diversas áreas.

Ahmadi e sua equipe esperam que, em 10 a 20 anos, a implementação do algoritmo seja mais viável e prática, trazendo avanços significativos para várias disciplinas.

Várias equações matemáticas
Expansão do método de Newton tem potencial para transformar áreas como aprendizado de máquina e otimização (Imagem: vectorfusionart/Shutterstock)

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