A ideia de que os peixes têm uma memória extremamente curta, durando apenas três segundos, é um mito que muitas pessoas acreditam. Essa crença ganhou ainda mais força com personagens como Dory, do filme “Procurando Nemo”, que sofre de perda de memória recente.
No entanto, estudos científicos recentes demonstram que a realidade é bem diferente. Os peixes possuem capacidades cognitivas surpreendentes, com memórias que podem durar semanas, meses e até mesmo anos.
O mito da memória de 3 segundos e sua origem
Imagem: Pixar Animation Studios / Divulgação
A noção de que peixes têm memória curta provavelmente surgiu de observações simplistas sobre seu comportamento em cativeiro. Como eles frequentemente repetem ações sem aparente aprendizado, muitas pessoas assumiram que não retêm informações.
No entanto, pesquisas realizadas em universidades ao redor do mundo mostram que essa visão está completamente equivocada.
Uma pesquisa realizada pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) revelou que o peixe-donzela, comum nos recifes brasileiros, possui memória significativa em interações sociais.
O estudo, publicado na Frontiers in Behavioral Neuroscience, mostrou que esses peixes reconhecem indivíduos familiares e reduzem sua agressividade quando encontram vizinhos conhecidos, mantendo essa memória por até 10 dias.
Pesquisadores australianos da Universidade Charles Sturt descobriram que a perca prateada (Bidyanus bidyanus) consegue lembrar de predadores mesmo após um único encontro, mantendo essa memória por até 12 meses. Kevin Warburton, um dos autores do estudo, afirmou que esses peixes evitam anzóis após uma experiência negativa, demonstrando aprendizado e memória de longo prazo.
Cientistas canadenses da Universidade MacEwan testaram a memória de ciclídeos africanos (Labidochromis caeruleus) em um experimento com recompensas alimentares. Os peixes foram treinados a associar uma área do aquário com comida e, mesmo após 12 dias longe desse ambiente, lembravam exatamente onde encontrar o alimento.
A memória é essencial para a sobrevivência dos peixes. Eles aprendem a reconhecer áreas de risco, identificar fontes de alimento e até formar laços com indivíduos específicos. O pesquisador Kevin Warburton afirma que espécies de peixes preferem a companhia de indivíduos familiares. Comportamento que indica que são capazes de reconhecer outros peixes de forma individual.
Além disso, peixes que escapam de anzóis tendem a evitar armadilhas semelhantes no futuro, revelando não apenas memória, mas também aprendizado adaptativo.
Em resumo, os peixes não apenas têm memória, como usam esse recurso para adaptar seus comportamentos, sobreviver e manter a harmonia nos ecossistemas. O mito dos “três segundos” é uma simplificação incorreta, que desconsidera a complexidade cognitiva desses animais.
No fundo dos oceanos, nas profundezas de cavernas e até mesmo enterrados no solo, existem criaturas que desafiam os limites da vida ao sobreviver em ambientes totalmente desprovidos de luz. Esses animais vivem em um mundo de escuridão, onde a visão muitas vezes se torna desnecessária e outros sentidos são refinados para garantir sua sobrevivência.
Alguns animais desenvolvem corpos translúcidos ou despigmentados, já que a coloração não tem utilidade na ausência de luz. Outros aprimoram sentidos como tato, audição e olfato para explorar o ambiente ao redor. Há ainda aqueles que contam com simbiontes para obter nutrientes ou que evoluíram estratégias de caça altamente especializadas.
Confira a seguir 8 animais que vivem no escuro e suas incríveis adaptações para sobreviver nestes ambientes.
8 animais que vivem no escuro e suas incríveis adaptações
Peixe-cego mexicano (Astyanax mexicanus)
O peixe-cego mexicano (Astyanax mexicanus), também chamado de tetra-cego, é um peixe de água doce que apresenta duas formas distintas: uma de superfície, com olhos funcionais e coloração prateada, e outra subterrânea, que evoluiu em cavernas e apresenta um olho vestigial, em função.
A forma cavernícola desse peixe possui características adaptativas notáveis, como a ausência de pigmentação, tornando-o translúcido ou esbranquiçado, além da degeneração dos olhos durante o desenvolvimento.
Para compensar a cegueira, ele desenvolveu um sistema sensorial apurado por meio da linha lateral, que permite detectar vibrações e mudanças na pressão da água, facilitando a navegação e a busca por alimento em ambientes escuros e com escassez de recursos.
Por conta dessa fascinante característica, o Astyanax mexicanus é utilizado em estudos sobre distúrbios visuais humanos, como a degeneração da retina, tornando-se um modelo para compreender a evolução e a plasticidade genética dos organismos.
Peixe-cego das cavernas mexicanas. Crédito: Pavaphon Supanantananont – Shutterstock
Peixe diabo-negro (Melanocetus johnsonii)
Esse peixe abissal é um predador impressionante da zona de escuridão do oceano. Vivendo a mais de 1.000 metros de profundidade, onde a luz solar não alcança, ele se destaca por sua aparência assustadora. Com dentes longos e uma boca capaz de engolir presas quase do seu próprio tamanho, já que seu estômago é extremamente flexível, possibilitando ingerir grandes quantidades de comida de uma vez, garantindo reservas para longos períodos sem alimento.
Para sobreviver nesse ambiente extremo, ele desenvolveu adaptações impressionantes, como um corpo escuro e flácido, que o ajuda a se camuflar na escuridão. Sua característica mais marcante é a presença de um filamento bioluminescente, chamado ilício, que se projeta da cabeça e atrai presas ao emitir luz por meio de bactérias simbióticas. Esse mecanismo permite que o diabo-negro cace sem gastar energia perseguindo suas vítimas, uma estratégia essencial em um ambiente com poucos alimentos.
Peixe diabo-negro. (Imagem: Monterey Bay Aquarium Research Institute)
Caranguejo-yeti (Kiwa hirsuta)
O caranguejo-yeti é um crustáceo descoberto em 2005 nas profundezas do Oceano Pacífico, próximo às fontes hidrotermais. Ele vive a mais de 2000 metros de profundidade, em um ambiente extremo sem luz solar e com temperaturas variando drasticamente devido às emissões químicas das fendas oceânicas.
Uma de suas características mais marcantes são as pinças cobertas por cerdas semelhantes a pelos, que abrigam colônias de bactérias quimiossintetizantes, que ajudam a converter os compostos químicos liberados pelas fontes hidrotermais em energia, fornecendo uma fonte alternativa de alimento para o caranguejo, que pode raspá-las e ingeri-las.
Caranguejo Yeti (Kiwa hirsuta). (Imagem: Bernard Wee/iNaturalist)
Além dessa relação simbiótica, o Kiwa hirsuta possui olhos reduzidos e não funcionais, então para se orientar e detectar presas ou perigos, ele depende de suas longas antenas e de sensores táteis e químicos espalhados pelo corpo. Sua coloração esbranquiçada também é um resultado da ausência de luz, pois não há necessidade de pigmentação para camuflagem.
Isópode-gigante (Bathynomus giganteus)
Esse crustáceo marinho é um dos maiores isópodes conhecidos, podendo atingir mais de 50 cm de comprimento. Habita as regiões abissais do oceano, geralmente entre 500 e 2.500 metros de profundidade, onde a comida é extremamente escassa e a pressão é altíssima. Seu formato achatado e sua rígida carapaça o protege de predadores e do ambiente hostil.
Isópode-gigante da espécie Bathynomus giganteus. (Imagem: kikujungboy CC/Shutterstock)
O isópode-gigante é um necrófago, o que significa que se alimenta de carcaças de peixes e mamíferos marinhos que afundam até o leito oceânico. Para sobreviver, possui um metabolismo extremamente lento e pode ficar meses sem se alimentar. Seu tamanho avantajado é um exemplo do fenômeno conhecido como gigantismo abissal, comum em invertebrados que vivem nas profundezas.
O grilo-das-cavernas, pertencente à família Rhaphidophoridae, é um inseto adaptado a ambientes subterrâneos onde a umidade e escuridão predominam, como cavernas, túneis e fendas em rochas. Esses grilos possuem pernas traseiras muito longas e antenas extremamente compridas, que os ajudam a se locomover e explorar o ambiente ao redor, mesmo sem depender da visão.
Muitas espécies dessa família têm olhos reduzidos ou ausentes, já que vivem em locais onde a luz é praticamente inexistente. Como compensação, desenvolveram um sistema sensorial apurado, usando suas antenas para detectar obstáculos, vibrações e a presença de outros organismos.
Como vivem em locais onde a comida é escassa, os grilos-das-cavernas são oportunistas, alimentando-se de matéria orgânica em decomposição, fezes de morcegos e até mesmo de outros insetos. Algumas espécies podem viver anos sem ingerir grandes quantidades de alimento, graças ao seu metabolismo reduzido.
Grilo das cavernas (Rhaphidophoridae). (Imagem: Tukkatar/Shutterstock)
Poliqueta Osedax sp. (o “verme-zumbi”)
No meio da escuridão, os vermes do gênero Osedax vivem fixados em ossos de baleias que afundam no oceano após sua morte. Sem boca, estômago ou sistema digestivo tradicional, eles contam com bactérias simbióticas para decompor os tecidos e os lipídios dos ossos, absorvendo os nutrientes de maneira indireta.
Uma característica fascinante desses poliquetas é o extremo dimorfismo sexual: as fêmeas são relativamente grandes e dominam os ossos, enquanto os machos permanecem microscópicos e vivem dentro dos corpos das fêmeas, apenas com a função de fertilizar seus ovos.
Criaturas abissais devoradoras de ossos parecem plantas, mas são animais que existem há mais de 100 milhões de anos no fundo dos oceanos. Imagem: Yoshihiro Fujiwara/JAMSTEC/Smithsonian Institution’s Ocean Initiative
Salamandra-cega-do-Texas (Eurycea rathbuni)
Essa salamandra aquática habita cavernas submersas no estado do Texas, nos Estados Unidos. Seu corpo é pálido, quase translúcido, e seus olhos são atrofiados e cobertos por pele, tornando-a completamente cega.
Para sobreviver na escuridão, a salamandra desenvolveu sentidos extremamente aguçados. Seus sensores na pele detectam vibrações na água, permitindo que perceba o movimento de presas, como pequenos crustáceos e insetos. Como o ambiente subterrâneo tem poucos recursos alimentares, essa espécie tem um metabolismo incrivelmente lento e pode sobreviver longos períodos sem comida.
Esse peixe das profundezas tem uma das aparências mais peculiares entre os animais que vivem sem luz. É uma espécie rara e fascinante que vive em profundidades entre 600 e 800 metros, nas zonas escuras do oceano Pacífico. Sua principal característica é a cabeça transparente e em forma de cúpula, através da qual se pode ver seus olhos verdes e tubulares, voltados para cima.
Esses olhos são extremamente sensíveis à luz e permitem que o peixe detecte as silhuetas de presas nadando acima dele, mesmo com pouquíssima luminosidade. Ao contrário do que parece, os “olhos” visíveis na frente do rosto são, na verdade, órgãos olfativos – os olhos reais estão dentro da cabeça translúcida.
Peixe olho-de-barril. (Imagem: Monterey Bay Aquarium Research Institute)
Ele se alimenta principalmente de pequenos animais gelatinosos, como sifonóforos, e é capaz de mover seus olhos dentro da cabeça para mirar à frente quando necessário.
Ao contrário da maioria dos peixes, seus olhos são orientados para cima e podem girar dentro do crânio, permitindo que ele enxergue presas acima sem precisar mover o corpo. Essa adaptação é fundamental para capturar pequenos organismos bioluminescentes que nadam na escuridão.
Pode parecer estranho, mas existe uma competição que define o animal mais feio do mundo. Assim como há torneios para saber quais foram os seres que mais se destacaram no ano. E o mais impressionante é que o mesmo peixe ganhou essas duas premiações.
A estrela dessa história leva o nome científico de Psychrolutes marcidus, e é popularmente chamado de peixe-bolha. Em setembro de 2013, a espécie venceu uma votação popular e se tornou o mascote oficial da Sociedade para a Preservação dos Animais Feios, da Inglaterra.
Algumas pessoas podem estar torcendo o nariz para um título desses, mas a intenção desse entidade é completamente louvável: a ideia é chamar a atenção das pessoas e das autoridades para todos os animais que correm risco de extinção, não apenas os fofos.
À época, o biólogo e presidente da Sociedade, Simon Watt, deu uma explicação bem razoável sobre o trabalho que desenvolvem:
“Nossa abordagem convencional à conservação é egoísta. Nós só protegemos animais com os quais nos identificamos porque eles são fofinhos, como os pandas. Se as ameaças de extinção são tão ruins quanto parecem, focar somente na fauna carismática não faz sentido”, disse o especialista.
“Não tenho nada contra pandas, mas eles têm quem os ajude. Já esses animais (os ‘feios’) precisam da nossa ajuda”, concluiu.
O peixe-bolha (Psychrolutes marcidus) fica com esse aspecto quando sobe para a superfície – Imagem: Kerryn Parkinson (NORFANZ Founding Parties) / Divulgação
O peixe do ano
Pois bem, se em 2013 o peixe-bolha foi considerado o animal mais feio do mundo, ele agora encontrou sua redenção.
A disputa tem como objetivo promover a conscientização sobre a vida aquática da região.
A espécie era um azarão na disputa – e acabou ganhando graças a uma campanha local.
O Psychrolutes marcidus vive no fundo do mar, em profundidades que variam entre 600 e 1,2 mil metros.
Ele é encontrado em regiões como a costa sudeste da Austrália e o litoral da Tasmânia.
A espécie pode crescer até cerca de 30 cm de comprimento e se alimenta de caranguejos, lagostas e moluscos.
Ele ganhou o apelido de peixe-bolha, pois seu corpo fica todo deformado quando sobe para a superfície.
No fundo do mar, ele se parece com um peixe normal, só que o seu corpo é gelatinoso.
Quando ele sobe para a superfície, a diferença de pressão faz que ele quase “derreta”, já que não possui um esqueleto completo.
E são essas fotos “derretidas” que deram a ele o título de animal mais feio do mundo.
No fundo do mar, ele tem a aparência de um peixe normal – Imagem: UW/NSF-OOI/CSSF Dive R1470; V11)
Risco de extinção?
Não existem muitos estudos sobre o peixe-bolha e, portanto, os cientistas não têm uma conclusão sobre o status de risco de extinção da espécie.
Os especialistas, porém, costumam alertar para eventuais perigos, uma vez que esses animais ficam muito próximos de caranguejos e lagostas e, com isso, acabam sendo vítimas de pesca de arrasto no fundo do mar.
Vale destacar que o peixe-bolha não faz parte do cardápio de nenhuma cultura no mundo, ou seja, ele não é nem sequer aproveitado como alimento depois de ser pego por esses pescadores.
Ao receber o título de Peixe do Ano, os organizadores da competição esperam que o peixe-bolha volte a chamar a atenção do mundo para os animais com risco de extinção. E ele parece ser o “garoto propaganda” perfeito para isso: se tem uma coisa que essa espécie faz é chamar a atenção das pessoas.
Na Austrália, pesquisadores encontraram o fóssil de uma espécie inédita de peixe de água doce com conteúdo estomacal preservado. Com idade estimada em 15 milhões de anos, o exemplar recebeu o nome de Ferruaspis brocksi e foi detalhado em um artigo publicado no Journal of Vertebrate Paleontology.
Entenda:
O fóssil de uma espécie inédita de peixe de água doce foi descoberto na Austrália;
O exemplar de 15 milhões de anos recebeu o nome de Ferruaspis brocksi, e é a primeira evidência desse tipo encontrada no país;
O conteúdo estomacal do peixe estava preservado, e apontou uma dieta rica em invertebrados com destaque para larvas de mosquitos;
Graças a uma técnica que jamais havia sido usada em peixes antes, também foi possível determinar a cor do fóssil, que tinha a barriga mais clara e duas listras laterais no corpo.
Fóssil de peixe descoberto na Austrália pertencia a espécie inédita. (Imagem: Laura Martin/University of New South Wales)
O F. brocksi é o primeiro fóssil de eperlano (pequeno peixe da família Osmeridae) de água doce descoberto na Austrália. Até então, não havia nenhuma evidência concreta que permitisse compreender a chegada da família ao país e se ela havia evoluído com o passar dos anos.
Conteúdo estomacal revelou detalhes sobre fóssil de peixe
Graças à preservação do conteúdo estomacal do fóssil, a equipe foi capaz de mergulhar fundo nos hábitos alimentares da espécie – que, como descobriram, consistia em uma variedade de invertebrados (principalmente pequenas larvas de mosquitos).
Conteúdo estomacal preservado revelou hábitos alimentares de peixe. (Imagem: Australian Museum)
Além disso, os pesquisadores também puderam identificar a cor do fóssil de F. brocksi. “O peixe era mais escuro na superfície dorsal, mais claro na barriga e tinha duas listras laterais ao longo do corpo. Usando um microscópio poderoso, conseguimos ver pequenas estruturas produtoras de cor conhecidas como melanossomos”, explicou Michael Frese, participante da pesquisa.
Frese completou dizendo que os melanossomos fossilizados já eram usados como uma forma de reconstruir a cor de penas, mas, até então, a técnica nunca havia sido aplicada no caso de peixes.