Pesquisadores do Japão usaram Inteligência Artificial (IA) para analisar imagens da Via Láctea e acabaram identificando estruturas semelhantes a bolhas que ainda não haviam sido registradas. Publicado nesta segunda-feira (17) no periódico científicoPublications of the Astronomical Society of Japan, o estudo pode ajudar a compreender melhor a formação de estrelas e a evolução das galáxias.
Em poucas palavras:
Cientistas usando IA descobriram bolhas cósmicas inéditas na Via Láctea;
Estruturas foram detectadas em imagens dos telescópios Spitzer e James Webb;
Algumas bolhas vêm de estrelas massivas; outras, de explosões de supernovas;
IA deve avançar na astronomia, revelando mais sobre galáxias e estrelas.
A equipe, liderada pela Universidade Metropolitana de Osaka, desenvolveu um modelo de aprendizado profundo, um tipo de IA que ensina computadores a reconhecer padrões em grandes volumes de dados. A tecnologia foi aplicada a imagens captadas por telescópios espaciais, permitindo a identificação de formações que passaram despercebidas nos bancos de dados astronômicos.
As imagens da esquerda mostram estruturas semelhantes a bolhas detectadas anteriormente, enquanto as da direita mostram a estrutura detectada neste estudo. Crédito: Universidade Metropolitana de Osaka
Bolhas na Via Láctea podem revelar segredos da formação das estrelas
A Via Láctea, assim como outras galáxias, contém bolhas cósmicas formadas durante o nascimento de estrelas massivas. Essas estruturas, chamadas de bolhas do Spitzer, são fundamentais para entender como estrelas e galáxias evoluem. Utilizando imagens dos telescópios espaciais Spitzer e James Webb, o modelo de IA conseguiu localizar essas bolhas com alta precisão.
Além disso, os pesquisadores detectaram estruturas semelhantes a conchas, que possivelmente se originaram após explosões de supernovas. Esses eventos liberam grandes quantidades de energia, influenciando a formação de novas estrelas e modificando a estrutura do meio interestelar.
O estudo foi conduzido por cientistas de várias instituições japonesas. O estudante de pós-graduação Shimpei Nishimoto, um dos autores da pesquisa, disse em um comunicado que a IA permite análises detalhadas da atividade estelar e dos impactos de eventos explosivos. Ele destacou que essa abordagem pode revelar aspectos do Universo que ainda são desconhecidos.
O professor Toshikazu Onishi, também envolvido no projeto, acredita que a IA terá um papel cada vez maior na astronomia. “No futuro, esperamos que os avanços na tecnologia de IA acelerem a elucidação dos mecanismos de evolução das galáxias e formação de estrelas”.
O neutrino mais energético já registrado foi detectado no Mar Mediterrâneo. Chamado de KM3-230213A, ele tem nível de energiamil vezes maior que fragmentos gerados pelo maior acelerador de partículas do mundo, o Grande Colisor de Hádrons (LHC, na sigla em inglês).
Segundo o estudo, o fenômeno carregava energia de 220 peta-elétron-volts (PeV), maior que qualquer episódio já catalogado. O evento foi registrado em fevereiro de 2023 e divulgado em fevereiro em artigo publicado na revista Nature.
A origem do neutrino ainda é desconhecida, mas pesquisadores já especulam hipóteses. Possivelmente, a partícula foi disparada por algum evento astronômico extremo, como blazares ou interações de raios cósmicos com o fundo cósmico de micro-ondas.
Descoberta pode ajudar a desvendar os mistérios dos blazares (Imagem: M. Kornmesser/ESO)
O que são estes fenômenos extremos?
Um Blazar é um tipo de galáxia ativa que hospeda um buraco negro supermassivo em seu centro;
O que torna os Blazares tão especiais é a maneira como eles emitem radiação eletromagnética, incluindo luz visível, raios-X e raios gama;
Já as interações de raios cósmicos com o fundo cósmico de micro-ondas (CMB, na sigla em inglês) ocorrem quando partículas extremamente energéticas, como prótons, colidem com fótons remanescentes do Big Bang;
Essas colisões podem gerar novas partículas, como píons, que decaem e produzem neutrinos de alta energia;
Esse processo ocorre em escalas cosmológicas e é um dos mecanismos que podem explicar a origem de neutrinos ultra-energéticos detectados na Terra.
O Cubic Kilometre Neutrino Telescope (KM3NeT) é um telescópio submarino instalado no fundo do Mar Mediterrâneo, projetado para detectar neutrinos de alta e baixa energia. Seus sensores estão distribuídos a até 3,5 mil metros de profundidade, onde a escuridão e a densidade da água ajudam a minimizar interferências.
Telescópio KM3NeT a 3.050 m de profundidade (imagem: Reprodução/KM3NeT)
A detecção do neutrino KM3-230213A foi realizada pelo ARCA, um dos dois sistemas do KM3NeT, especializado em partículas de altíssima energia. O telescópio identifica neutrinos ao observar os clarões de luz azul produzidos quando essas partículas atravessam a água do mar e interagem com outras partículas, gerando radiação Cherenkov.
Esse brilho é captado por módulos ópticos digitais (DOMs, na sigla em inglês), equipados com fotomultiplicadores que registram o evento e permitem reconstruir a trajetória e a energia do neutrino.
Os pesquisadores ainda não chegaram a uma conclusão se o neutrino veio de um blazar ou das interações de raios cósmicos com o fundo cósmico de micro-ondas (CMB, na sigla em inglês). Saber de onde veio a partícula pode ajudar a entender melhor esses fenômenos.
Desde que começou a operar em 2022, o Telescópio Espacial James Webb (JWST), da NASA, tem transformado nossa compreensão do Universo primitivo. Agora, as observações mais recentes sugerem algo inesperado: a possibilidade de que o próprio Universo esteja dentro de um buraco negro.
O JWST, um projeto de US$10 bilhões, descobriu que a maioria das galáxias distantes giram na mesma direção. Aproximadamente dois terços delas giram no sentido horário, enquanto a fração restante gira para o lado oposto. Em um Universo aleatório, os astrônomos esperariam uma distribuição de 50% para cada lado, o que sugere uma orientação preferencial na rotação galáctica.
As observações fazem parte do programa JADES (sigla em inglês para Pesquisa Extragaláctica Profunda Avançada do JWST), que analisou 263 galáxias. Os resultados levantam dúvidas sobre a natureza do Universo e indicam que talvez ele tenha nascido girando. Essa ideia se encaixa na teoria de que o cosmos pode ser o interior de um grande buraco negro.
Galáxias observadas pelo JWST com aquelas girando em uma direção circuladas em vermelho, aquelas girando na outra wat circuladas em azul. Crédito da imagem: Monthly Notices of the Royal Astronomical Society (2025)
Um Universo dentro de outro
A hipótese, chamada de “cosmologia dos buracos negros” ou “cosmologia de Schwarzschild”, sugere que nosso Universo faz parte de um buraco negro dentro de outro Universo maior. O conceito foi originalmente proposto pelos cientistas Raj Kumar Pathria e I. J. Good e ganhou força com pesquisas mais recentes.
A ideia se baseia no “raio de Schwarzschild”, também conhecido como “horizonte de eventos” – a fronteira além da qual nada pode escapar de um buraco negro. Se isso for verdade, o horizonte de eventos do nosso Universo poderia ser equivalente ao limite de um buraco negro dentro de um “Universo pai”.
Isso poderia significar também que cada buraco negro dentro do nosso Universo pode ser uma passagem para um “Universo bebê”. Esses Universos seriam invisíveis para nós, pois estariam separados por seus próprios horizontes de eventos, impossibilitando a troca de informações entre eles.
Essa possibilidade foi defendida pelo físico teórico polonês Nikodem Poplawski, da Universidade de New Haven, nos EUA. Segundo ele, os buracos negros não se tornam singularidades infinitamente densas, mas sim pontos de transição para novas realidades.
Galáxias espirais vistas pelo JWST. Enquanto as galáxias circuladas em azul giram na direção oposta à da Via Láctea, as de vermelho giram da mesma direção da nossa galáxia. Crédito da imagem: Monthly Notices of the Royal Astronomical Society (2025)
Como os buracos negros criariam novos Universos?
Buracos negros se formam quando o núcleo de uma estrela massiva colapsa. A matéria em seu interior atinge densidades extremas, muito superiores às encontradas no restante do cosmos.
Na teoria de Poplawski, quando essa densidade atinge um limite crítico, um mecanismo associado à torção e à rotação do espaço-tempo impede que a matéria continue colapsando. Em vez disso, ocorre um efeito de “salto”, como uma mola comprimida que se expande de forma abrupta.
Essa expansão rápida poderia ser a origem do nosso próprio Universo. Isso explicaria o Big Bang e a rápida inflação cósmica que se seguiu, resultando na aparência homogênea e isotrópica do cosmos em grande escala.
Segundo Poplawski, esse processo cria uma ponte Einstein-Rosen, popularmente chamada de “buraco de minhoca“, conectando o Universo bebê ao Universo pai. Isso significa que nosso Universo poderia ser simplesmente um novo ciclo dentro de uma cadeia infinita de realidades geradas por buracos negros.
A teoria de Poplawski sugere que os buracos negros possuem rotação e que essa rotação pode ser herdada pelos Universos que nascem dentro deles. Se nosso Universo surgiu a partir de um buraco negro giratório, isso explicaria por que há uma direção preferida para a rotação das galáxias.
O JWST observou um alinhamento na rotação das galáxias que pode ser uma evidência desse fenômeno. Segundo Poplawski, essa descoberta pode indicar que nosso Universo realmente surgiu dentro de um buraco negro maior, cuja rotação influenciou a dinâmica das galáxias em nosso próprio cosmos.
“A torção do espaço-tempo fornece o mecanismo mais natural para evitar a formação de uma singularidade em um buraco negro e, em vez disso, criar um Universo fechado”, explicou Poplawski em um comunicado, acrescentando que um eixo preferencial de rotação no Universo poderia ser um traço herdado do buraco negro do qual surgiu.
Embora a hipótese de que o Universo está dentro de um buraco negro seja intrigante, há uma explicação alternativa para os dados do JWST.
Alguns cientistas sugerem que a rotação da própria Via Láctea pode ter influenciado as observações. No passado, a rotação da nossa galáxia era considerada lenta demais para impactar medições tão distantes. No entanto, se esse efeito for significativo, pode ser necessário recalibrar as medições de distância no Universo.
Uma recalibração afetaria a compreensão de fenômenos fundamentais, como a taxa de expansão do Universo e a idade de galáxias distantes que hoje parecem mais velhas do que o próprio Universo.
Se o JWST realmente identificou um padrão de rotação que aponta para a origem do Universo dentro de um buraco negro, isso poderia revolucionar a cosmologia. A ideia de que cada buraco negro pode dar origem a um novo Universo sugeriria um modelo cíclico, no qual novos cosmos surgem continuamente.
A pesquisa foi publicada no Monthly Notices of the Royal Astronomical Society e ainda precisa ser confirmada por estudos adicionais. Se for validada, pode mudar completamente nossa concepção sobre o que realmente é o Universo.
A câmera LSST – a maior câmera digital do mundo – foi instalada no Observatório Vera C. Rubin, no Chile. Agora, o observatório está na última fase de testes antes de usar a câmera (com mais de 3 gigapixels e quase três toneladas) para mapear o Universo de forma sem precedentes.
No início de março, a equipe do observatório levantou a câmera para a posição no Telescópio de Levantamento Simonyi. “Este é o último grande passo na construção de uma das instalações científicas mais ambiciosas já criadas”, disse Sethuraman Panchanathan. Ele é o diretor da Fundação Nacional de Ciências dos EUA (NSF, na sigla em inglês), que financia o observatório junto ao Departamento de Energia (DOE).
Maior câmera digital do mundo vai ajudar a aprofundar pesquisas sobre o Universo
A câmera digital gigante foi projetada para fazer uma varredura do céu a cada três dias, em movimentos repetitivos, tirando uma foto a cada 30 segundos. Isso vai ajudar no aprofundamento das pesquisas sobre o Universo.
Maior câmera digital do mundo, a câmera LSST, instalada no Observatório Vera C. Rubin, no Chile, tem mais de 3 gigapixels (Imagem: RubinObs/NOIRLab/SLAC/NSF/DOE/AURA/B. Quint)
O nome da câmera é uma sigla, em inglês, para Levantamento do Legado do Espaço e do Tempo. Sua resolução passa dos 3 gigapixels, seu peso beira três toneladas e seu tamanho é praticamente o de um carro.
Financiado pelo governo dos EUA, o desenvolvimento da câmera LSST custou aproximadamente US$ 800 milhões (cerca de R$ 4,6 bilhões). E chegou ao observatório no começo de junho de 2024.
O Observatório Vera C. Rubin consiste num telescópio terrestre de campo largo de oito metros de largura, a câmera LSST e um sistema automatizado de processamento de dados. O telescópio vai gerar aproximadamente 20 terabytes de dados por noite e sua exploração de dez anos produzirá um banco de dados de catálogo de 15 petabytes.
Câmera LSST chegou ao Observatório Vera C. Rubin, no Chile, em junho de 2024 (Imagem: Olivier Bonin/SLAC National Accelerator Laboratory)
Alcançaremos um nível de clareza e profundidade nunca visto antes em imagens que cobrem todo o céu do hemisfério sul.
Aaron Roodman, Diretor da Câmera LSST e Vice-Diretor da Construção do Rubin no Laboratório Nacional de Aceleradores (SLAC), da Universidade de Stanford, em comunicado do observatório
O objetivo da exploração será investigar a natureza da energia escura e da matéria escura no Universo, além de estudar a possibilidade de colisão entre asteroides e a Terra, ou estrelas e planetas próximos ao Sol.
E se a água for quase tão antiga quanto o Universo? Simulações indicam que ela pode ter surgido apenas 100 milhões de anos após o Big Bang. As primeiras estrelas, ao explodirem como supernovas, liberaram os elementos necessários para a formação das primeiras moléculas de H₂O. Isso significa que a água pode ter existido muito antes do que se imaginava.
Pesquisadores modelaram essas explosões para entender como os primeiros elementos pesados, como oxigênio, foram gerados e reagiram com o hidrogênio. No resfriamento dos gases, moléculas de água se formaram em meio aos destroços estelares. O estudo sugere que esse processo aconteceu muito antes do que se pensava, tornando a água um composto comum desde o início do cosmos.
Se confirmada, essa descoberta muda a visão sobre a origem da vida. Se a água já era abundante, planetas com condições propícias podem ter surgido muito antes do esperado. Além disso, a quantidade de água no Universo primitivo pode ter sido comparável à da Via Láctea atual, ampliando as possibilidades de mundos habitáveis desde os primeiros tempos.
Simulações revelam pistas sobre a origem da água no cosmos
Daniel Whalen e sua equipe, da Universidade de Portsmouth, simularam explosões de estrelas primordiais para entender como os primeiros elementos pesados interagiram no Universo jovem.
Os modelos mostraram que, ao resfriarem, os gases expelidos permitiram a formação de moléculas de H₂O muito antes do esperado. Além disso, essas supernovas liberaram oxigênio suficiente para reagir com o hidrogênio e gerar água nos primeiros 100 milhões de anos após o Big Bang.
Supernovas destroem estrelas, mas também espalham elementos essenciais para a vida (Imagem: muratart/Shutterstock)
O estudo, publicado na Nature Astronomy, indica que a água já existia em galáxias primitivas em quantidades consideráveis. As simulações também sugerem que regiões ricas em metais favoreceram a formação de planetas rochosos ao redor de estrelas de baixa massa. Assim, se confirmada, essa descoberta reforça a possibilidade de que planetas com água surgiram muito antes do que a ciência estimava.
Por fim, Whalen destaca que esses achados podem mudar a forma como enxergamos a evolução do Universo. Se a água já era abundante desde o início, a busca por vida extraterrestre pode ganhar um novo rumo. Em vez de focar apenas em sistemas mais recentes, astrônomos podem investigar vestígios de planetas habitáveis em algumas das galáxias mais antigas conhecidas.
Água e os blocos de construção do cosmos
As simulações de Whalen e sua equipe sugerem que a água não apenas surgiu cedo no Universo, mas, também, desempenhou papel fundamental na formação de planetas e estrelas ricas em metais pesados;
Os remanescentes densos das supernovas criaram regiões propícias para novos sistemas estelares, onde discos protoplanetários poderiam gerar asteroides primitivos com água, ampliando as chances de ambientes favoráveis à vida;
Além disso, os cientistas apontam que explosões sucessivas de supernovas na mesma região podem ter acelerado esse processo;
Em áreas mais densas, os choques das explosões teriam criado núcleos compactos, aumentando a retenção de água;
Já em regiões com menos gás, a radiação poderia ter destruído parte dessas moléculas, reduzindo sua preservação.
Os cálculos indicam que as primeiras galáxias produziram quase tanta água quanto a Via Láctea, com uma diferença de apenas dez vezes menos. Isso sugere que um dos principais ingredientes da vida sempre foi abundante e que planetas com água podem ter se formado muito antes do que imaginamos.
Carbono, oxigênio, ferro… os blocos fundamentais da vida vieram das estrelas (Imagem: Jacques Dayan – Shutterstock
Vivemos uma era de ouro na exploração espacial. Cientistas têm reunido, em ritmo recorde, uma quantidade impressionante de dados e evidências científicas. Mesmo assim, a pergunta ancestral persiste: estaremos nós sozinhos no Universo?
Novas tecnologias em telescópios – incluindo instrumentos espaciais, como o James Webb – possibilitaram a descoberta de milhares de exoplanetas potencialmente habitáveis, que poderiam suportar formas de vida semelhantes às da Terra.
Além disso, detectores de ondas gravitacionais abriram nova fronteira ao identificar distorções no espaço-tempo causadas por buracos negros e supernovas a milhões de anos-luz de distância.
Ilustração de grande rocha vermelha na base devido ao calor, voando pelo Espaço em direção à Terra, com estrelas no Espaço ao fundo (Imagem: Agência Espacial Europeia)
Os empreendimentos espaciais comerciais têm acelerado esses avanços, culminando em espaçonaves cada vez mais sofisticadas e foguetes reutilizáveis – sinais inequívocos de que uma nova era na exploração espacial está em curso.
Em exemplo marcante, a missão OSIRIS-REx, da NASA, pousou, com sucesso, no asteroide Bennu, que se encontrava a 333,13 milhões de quilômetros da Terra, recolhendo amostras de rochas e poeira. Vários países já demonstraram a capacidade de enviar robôs para a Lua e Marte e projetos ambiciosos preveem o envio de humanos para esses corpos celestes no futuro.
No centro de todas essas iniciativas está a questão primordial: existe – ou já existiu – vida em algum outro lugar do Universo?
O desafio de definir a vida
Surpreendentemente, definir “vida” é uma tarefa complexa. Embora reconheçamos instintivamente os organismos vivos, uma definição precisa ainda escapa à ciência;
Dicionários descrevem a vida como a capacidade de crescer, reproduzir-se e responder a estímulos, mas tais definições podem ser vagas;
Uma abordagem mais abrangente considera a vida como um sistema químico autorregulado, capaz de processar informações e manter um estado de baixa entropia, com pouca desordem ou aleatoriedade;
Os seres vivos dependem continuamente de energia para sustentar sua organização molecular e manter suas estruturas e funções altamente ordenadas. Sem essa energia, o sistema entraria rapidamente em colapso;
Essa definição ressalta a natureza dinâmica e complexa da vida, destacando sua habilidade de adaptação e evolução.
Na Terra, a vida – como a conhecemos – fundamenta-se na interação entre DNA, RNA e proteínas. O DNA funciona como o projeto vital, contendo as instruções genéticas essenciais para o desenvolvimento, a sobrevivência e a reprodução dos organismos.
Essas instruções são traduzidas em mensagens que orientam a síntese de proteínas, verdadeiros “trabalhadores” responsáveis por inúmeras funções celulares. Apesar dessa base complexa, é possível que o Universo abrigue formas de vida que se desenvolvam segundo princípios e bioquímicas completamente diferentes.
Vista do céu noturno com um céu estrelado ao fundo e muitos meteoros voando pela atmosfera, aparecendo como traços brancos, com árvores e plantas em primeiro plano (Imagem: Kenneth Brandon)
Além do carbono
Como explana o Space.com, a vida em outros cantos do Universo pode, inclusive, utilizar elementos distintos como blocos fundamentais. O silício, por exemplo, que compartilha algumas semelhanças químicas com o carbono, já foi apontado como possível alternativa.
Se existirem, organismos à base de silício poderiam apresentar características e adaptações singulares, como estruturas de sustentação similares a ossos ou conchas, mas formadas por silício.
Embora ainda não tenham sido descobertas formas de vida baseadas em silício, esse elemento exerce papel importante em diversas criaturas na Terra. Ele atua como componente secundário em muitas plantas e animais, desempenhando funções estruturais e funcionais.
Um exemplo são as diatomáceas – algas marinhas cujas paredes celulares vítreas são compostas de dióxido de silício. Isso demonstra que o silício pode funcionar como bloco de construção biológico, mesmo que as diatomáceas não sejam consideradas organismos baseados nesse elemento. A existência e a aparência de formas de vida totalmente baseadas em silício, entretanto, permanecem um mistério.
Existem hipóteses divergentes sobre como a vida surgiu na Terra. Uma delas defende que os blocos construtores da vida teriam sido trazidos por meteoritos ou estariam presentes neles. Outra hipótese sugere que esses componentes se formaram espontaneamente por meio de processos geoquímicos no ambiente primitivo do planeta.
Meteoritos encontrados na Terra já foram identificados como portadores de moléculas orgânicas, inclusive aminoácidos essenciais. É plausível que essas moléculas tenham se formado no Espaço profundo e sido depositadas em nosso planeta por meio de impactos de meteoritos e asteroides.
Por outro lado, processos geoquímicos ocorridos em pequenas poças quentes ou em fontes hidrotermais no fundo dos oceanos também podem ter criado as condições ideais para o surgimento da vida.
Apesar dos avanços, nenhum laboratório ainda conseguiu demonstrar, de forma completa e definitiva, o caminho que levou à formação do RNA, DNA e das primeiras células vivas.
Um aspecto interessante é a quiralidade de muitas moléculas biológicas – elas existem em duas formas que são imagens espelhadas, como as mãos esquerda e direita. Embora normalmente essas formas sejam produzidas em quantidades iguais, análises recentes de meteoritos detectaram leve assimetria, favorecendo a forma “mão esquerda” em até 60%.
Essa mesma assimetria é observada em todas as biomoléculas na Terra – proteínas, açúcares, aminoácidos, RNA e DNA –, sugerindo que esse desequilíbrio, possivelmente originado do Espaço, pode ter influenciado a origem da vida terrestre.
Vista da galáxia espiral, que se assemelha a nuvens negras girando em torno de um centro azul (Imagem: ESA/Webb/NASA/CSA, J. Lee/PHANGS-JWST., CC BY-NC-ND)
Probabilidades e a equação de Drake
O leve desequilíbrio na quiralidade das moléculas orgânicas pode indicar que a vida na Terra tenha se originado com a entrega de componentes orgânicos vindos do Espaço. Nesse cenário, poderíamos ser descendentes de formas de vida que tiveram origem em outros locais do cosmos.
A equação de Drake, formulada pelo astrônomo Frank Drake em 1961, oferece maneira de estimar o número de civilizações detectáveis em nossa galáxia, levando em conta fatores, como a taxa de formação de estrelas, a fração de estrelas com planetas e a proporção desses planetas onde a vida inteligente pode emergir. Estimativas otimistas sugerem que na Via Láctea poderiam existir até 12,5 mil civilizações alienígenas inteligentes.
O argumento central para a existência de vida extraterrestre é, em grande parte, probabilístico: considerando o imenso número de estrelas e planetas, é altamente improvável que a vida não tenha surgido em outros lugares.
A probabilidade de a humanidade ser a única civilização tecnológica no Universo observável é inferior a uma em dez bilhões de trilhões, enquanto a chance de uma civilização se desenvolver em um único planeta habitável é melhor do que uma em 60 bilhões.
Com cerca de 200 bilhões de trilhões de estrelas no Universo observável, a existência de outras espécies tecnológicas é extremamente provável – possivelmente inclusive dentro da nossa própria Via Láctea.